sexta-feira, 24 de maio de 2013

A Bibliotecária e a estrada de terra


“Quem acende uma luz é o primeiro a ser iluminado”


  Este ano atuei por três meses, na zona rural de Venda Nova, na localidade do Caxixe, com esta experiência me dei conta do quão importante e necessária pode ser nossa atuação como profissionais da informação e da leitura.
  Confesso que não tem sido fácil o caminho escolhido. Trabalhar em bibliotecas públicas no Brasil muitas vezes é sinônimo de “grandes dificuldades”. Nosso país apesar de já ter dado passos largos nos últimos anos em prol da educação e da formação de leitores, infelizmente não alcançou o patamar desejado e ainda há muito trabalho a fazer.
  Do ônibus que me levou para o trabalho, observava paisagens e ao mesmo tempo, as crianças e professoras. Elas, guerreiras corajosas e cheias de garra, educadoras com um longo caminho a percorrer em estrada de terra onde o ônibus as sacudia junto com alunos sorridentes e barulhentos já sonhando com as primeiras letrinhas escritas. 
  É muito gratificante ver que apesar de todas as dificuldades, muitos têm a coragem e o calor na alma que impulsiona para o futuro melhor, pois estudando, dominando a leitura e a escrita terão oportunidades melhores. Dizem que o brasileiro “não gosta de ler”, mas eu me pergunto sinceramente: o brasileiro não gosta de ler ou, o brasileiro não teve durante décadas e décadas acesso democrático aos livros?
  O bibliotecário tem um importante papel a desempenhar como “agente de transformação”, mas infelizmente a sociedade além de não reconhecer este profissional, também desconhece seus talentos, sendo comum comentários do tipo: Precisamos realmente de um Bibliotecário? Para quê ele serve? Nossa! Existe curso superior de Biblioteconomia?
  O antigo mito do “Bibliotecário mal humorado, guardião dos livros” ainda resiste em muitos lugares do Brasil e faz com que se tenha uma idéia deturpada da realidade que é a do profissional atualizado, pró-ativo, eficiente e engajado no processo da construção de uma nação leitora.
  A sociedade precisa se conscientizar da importância das bibliotecas no processo de ensino e os benefícios que oferece para os que buscam nela o conhecimento. Os profissionais precisam se reciclar, mudar sua postura, repensar suas práticas, se tornarem mais humanos, pró-ativos e menos tecnicistas.
  Na era digital é preciso que a informação seja encontrada com precisão e eficiência, avaliada e disseminada para os que precisam e assim, absorvida e compreendida, se tornar conhecimento. Este é o caminho traçado com qualidade e eficiência e só assim, haverá progresso e evolução, porque informação compreendida e disseminada é poder adquirido.
  Informação estagnada, apertada em prateleiras de estantes, onde o público não é cativado e incentivado para consultar não serve para nada. Somado a isso se o profissional também não tem carisma e amor pelo que faz, a única coisa que se conseguirá transmitir é o vazio da ignorância.
  O conhecimento que vem pelo domínio da leitura é uma arma poderosa e invencível, contra o analfabetismo, contra a ignorância, contra a falta de perspectivas e principalmente contra a falta de esperança num futuro melhor, mais digno. 
  O professor que lê, será um bom formador de leitores, pais que leem formam filhos leitores, um governante que lê e valoriza a leitura, com certeza está se preocupando com o futuro das suas crianças. Um Bibliotecário que trabalha com o coração e se empenha na busca por uma biblioteca eficiente e ativa está trabalhando em prol do progresso, pois um povo leitor, certamente será mais esclarecido, mais crítico e menos manipulável, consequentemente, mais iluminado.
  A luz que brilha nas mãos dos Bibliotecários, precisa ser mais forte e mais ardente, caso contrário se tornará só uma vela , fraca e sem brilho, no fundo de um túnel escuro e sem volta.

(Texto publicado na Tribuna Livre do Jornal A Tribuna do dia 10/12/2010)

O pão da alma...



Meu pai tem 65 anos...

Na sua dura infância, quase não frequentou a escola, só aprendeu a ler e a escrever.

Isto, porém não fez dele um homem de pedra pelo contrário, ele é etéreo e tudo que sou é graças à ele e toda sua sabedoria, conquistada lendo por conta própria um universo de livros que eu formada, não sei se um dia conseguirei ler...

Eu estava no primeiro ano do "primário" quando um dia ele resolveu construir uma escrivaninha embaixo de uma grande árvore que havia no quintal de casa, me disse assim: é para você estudar...

Quantas tardes eu passei ali naquele agradável recanto de luz e sombra amena. Nas leituras difíceis eu ia sorvendo minhas primeiras vitórias.

Quanto amor brotou deste simples gesto, quantos laços e nós indissolúveis se fizeram nestes momentos em que junto dos livros, aprendíamos também que a vida poderia ser boa e diferente sim, porque os livros lidos com certeza iam tornando-a mais feliz, mais leve e mais completa.

Acho que na verdade ele só queria agradar e tudo que fez por nós toda sua vida, fez por amor. Mas no fundo quem ganhou mais fui eu. Ganhei cada dia mais paixão e amor pelos livros e hoje esta paixão se tornou também minha profissão, sou bibliotecária.

Tenho boas recordações da minha infância simples e feliz em São Paulo, cresci vendo meu pai com livros nas mãos e assim, silenciosamente ele foi me ajudando a traçar meu caminho. Me ensinou que cuidando da vida, mesmo que seja com um gesto simples, um livro lido, o futuro pode ser muito diferente, muito melhor...

Ele cuidou de mim e hoje com meu trabalho, posso cuidar de outras crianças também. A leitura é assim mesmo.. Silenciosa, solitária, mas quanto nos diz, quanto nos ilumina, quanto nos alimenta.

Obrigada pai, pelo pão que também nunca faltou para minha alma.


(Escrevi este texto há 2 anos atrás...)